Porto inseguro
A Prefeitura do Rio ameaça processar a Caixa Econômica Federal para que seja cumprido acordo de repasse de verba destinada à manutenção da Região Portuária. Alegando a crise no mercado imobiliário, o banco ainda não liberou um centavo sequer da verba prevista para aquela área, que é de R$ 147 milhões.
Após transformar a esquecida beira-mar do Centro numa nova área de lazer e atrair milhares de visitantes, o Porto Maravilha – a maior parceria público-privada do Brasil – está mais uma vez sob ameaça. A Prefeitura avalia recorrer à Justiça para que a Caixa Econômica Federal cumpra o acordo firmado em agosto, no qual se comprometia repassar recursos para a manutenção da região, suspensos sob a alegação da crise no mercado imobiliário. Até hoje, o banco não liberou um centavo sequer dos R$ 147 milhões para infraestrutura e limpeza que deveriam ser transferidos em 12 parcelas.
O problema se arrasta. Há dois anos, o município arca com as despesas para recolher lixo e cuidar de calçadas e da iluminação da área revitalizada. Mas esses custos seriam da Caixa, que é a responsável pela gestão de um fundo imobiliário do qual deveriam sair os recursos para garantir a manutenção do espaço sem a necessidade de usar dinheiro público.
– Notificamos a Caixa extrajudicialmente. O próximo passo é buscar um acordo em uma câmara de conciliação de conflitos. Se não der certo, vamos cobrar em juízo o repasse dos recursos – disse o presidente da Companhia de Desenvolvimento Urbano do Porto (Cdurp), Antonio Carlos Mendes Barbosa.
GASTO DE R$ 342,2 MILHÕES
O impasse atinge serviços urbanos de uma área de cinco milhões de metros quadrados, que abrange partes de cinco bairros do Rio: Centro, Caju, Gamboa, Saúde e Santo Cristo. Para tentar minimizar os efeitos do vazio deixado pela Caixa, a prefeitura já destinou, desde 2017, R$ 342,2 milhões para o Porto Maravilha.
Os repasses do banco estão suspensos desde junho de 2016. Com a crise financeira, o mercado imobiliário se retraiu, e o banco viu encalhar um título conhecido como Certificado do Potencial Adicional de Construção (Cepac), que permite construir na Zona Portuária acima de um gabarito mínimo. A premissa era que, desses papéis, viriam os recursos não apenas para executar as obras, mas para manter o que já foi feito.
Mas, mesmo se o acordo fosse honrado, não resolveria outro problema. Hoje, apenas 50% das intervenções em infraestrutura foram concluídas, e há dois anos nenhuma obra nova começou. O cronograma previa que os serviços terminassem em 2022, mas não há garantias de que será cumprido. Alguns projetos importantes para o setor imobiliário ainda não saíram do papel. Isso inclui a reurbanização da Avenida Francisco Bicalho, onde a legislação permite construir prédios de até 50 andares. Também não andaram intervenções como a implantação de vias de BRT no Túnel João Ricardo, para que o corredor Transbrasil chegue até a Central, bem como a urbanização no entorno da Praça da Harmonia.
– A situação é ruim para a Caixa no momento em que o mercado imobiliário reaquece. O Porto Maravilha é um ativo importante, não apenas para a cidade – disse o presidente da Cdurp, órgão da prefeitura.
A Caixa informou que “permanece em agendas periódicas com todos os agentes relacionados ao Porto Maravilha, para assegurar a continuidade do desenvolvimento da área e a valorização dos ativos que compõem sua carteira de investimentos”.
Devido a essa indefinição, em junho, a prefeitura decidiu fazer por contra própria os serviços de manutenção para reduzir custos. A concessionária Porto Novo – até então responsável por essa manutenção, que no auge do projeto chegou a ter mil funcionários – hoje só conta com 170 pessoas, que operam os túneis Marcelo Allencar e Rio 450 e estão concluindo obras iniciadas antes da crise.
Mas os serviços têm deixado a desejar. No canteiro em frente ao Armazém Utopia, o mato chega a um metro de altura. O calçadão tem pedras soltas. A grama dos arredores do parquinho, ali perto, clama por água e limpeza e há lixo espalhado por toda parte. Os brinquedos também precisam passar por conservação: o paredão de escalada tem um buraco de 20 centímetros.
– Vim conhecer o Boulevard Olímpico porque tinham me recomendado. Mas está totalmente abandonado – disse o nutricionista Felipe Marangon, de Brasília, que visitou a região ontem com a mulher e os filhos.
Na Praça Mauá, boa parte das bolinhas de metal que sinaliza o caminho para cegos nos arredores dos trilhos do VLT já foi roubada.
– Com a prefeitura, a qualidade piorou. Hoje, temos dois garis para varrer e tirar o lixo. Eles não dão conta. A Porto Novo mantinha equipes quase 24 horas por dia – disse o comerciante João Santos.
Fonte: O Globo
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